CASO MAURÍCIO É PREOCUPANTE PORQUE, DE NOVO, PASSA A MENSAGEM ERRADA

Caio Oleskovicz
5 min readOct 27, 2021

Não adianta nada acharmos que o afastamento do cidadão é uma vitória expressiva das atitudes melhores, uma vez que ela não aconteceu por o clube ser contra a homofobia. É uma vitória — mas, de novo, pelos motivos errados.

O jogador de vôlei da Seleção Brasileira, Maurício Souza, foi demitido pelo seu time — o Minas Tênis Clube. A decisão foi tomada após represálias da mídia, torcida e, principalmente, patrocinadores, por uma declaração homofóbica do jogador feita no Instagram — e outras atitudes que pioraram ainda mais a situação, como a famosa “desculpa para quem se sentiu ofendido”. Esses são os fatos. Agora vem a parte da opinião. Se preparem para o famoso “leia mais…”.

A declaração no Instagram foi uma crítica — extremamente babaca, diga-se de passagem — ao fato da DC ter feito o Superman bissexual em novos quadrinhos; basicamente, era uma imagem de um beijo entre dois homens (Superman e alguém que não conheço) com um comentário dizendo “A é só um desenho, não tem nada demais. Vai nessa que vai ver onde vamos parar…”. Primeiramente, a declaração é homofóbica sim. A noção de “onde iremos parar” é OBVIAMENTE negativa, então não venham com maucaratismos de dizer que “ele não falou nada diretamente ruim”, porque É diretamente ruim — é a manifestação de uma cultura predominante que não quer ver coisas que considera inferiores, nojentas, abomináveis: porque é esse o contexto que “vai ver onde vamos parar” passa. Em 100% dos casos. Sem discussão semântica aqui.

Maurício Souza foi afastado do time, até por ter colegas homossexuais em sua equipe (a famosa torta de climão recheada com falta de noção), uma escolha feita pelo Minas que achei extremamente adequada. Você é livre para falar quaisquer besteiras que quiser, com um único detalhe: aguente as consequências da sua boca. Patrocinadores, torcedores, comissão técnica e etc. podem se sentir constrangidos, inadequados, humilhados, por uma opinião sua, qualquer que seja.

O retorno de Maurício era condicionado a um pedido de desculpas público, que ele fez, no Twitter. Obviamente, como ocorre em praticamente todos esses casos, a emenda saiu pior que o estrago: Maurício pediu desculpas em seu Twitter, à época com 51 seguidores (eu, Caião da Massa, tenho quase isso), e pediu aquelas “desculpas” que dizem que o verdadeiro culpado é quem se incomodou com sua babaquice; aquele pedido de desculpas hipócrita, que soa como “quem se sentiu ofendido, me desculpe, amadurece, tenha empatia aí pô. Aos ‘normais’, segue o jogo, continuo com a minha opinião”. Maurício reafirmou por diversas oportunidades que manteria sua opinião e seus “valores” (de humilhar os outros, sem nem um motivo sequer), mas que mesmo assim pedia desculpas (porque, claro, ele é muitíssimo gente boa).

O cenário bizarro do atrofiamento cerebral das pessoas faz com que endossem esse discursinho podre de que “estão censurando opiniões”. As represálias de todas as frentes, contudo, não se tratam de censura, e sim… Represálias. Há uma diferença entre eu dar um soco na sua cara versus eu parar de te apoiar financeiramente porque discordo. Aqueles gemidos de “cultura do cancelamento”, dentre outras idiotices (que, infelizmente, são aplicáveis a uma miríade de outras situações), respingaram no caso; e por conseguinte, Maurício tem um belo número de acéfalos que o apoiam nesse discurso ridículo.

Então, se você faz/diz isso, pare. Sério. Sua mãe chora no banho. Ou não, porque te criou dessa forma tosca mesmo.

Dito isso, a rescisão contratual de Maurício não se deu porque o Minas não concorda com o discurso. Jornalistas do GE escrevem, e eu transcrevo à risca: “O clube belo-horizontino usou a conta própria para dar mais visibilidade à mensagem [do “pedido de desculpas”] e considerava que, a retratação pública, pedida, tinha sido realizada. Contudo, houve insatisfação de uma das patrocinadoras.” Observe que o clube não tem interesse nenhum em ser contra a homofobia, e sim só agiu porque dói no bolso. Obrigado, patrocinadora: você fez o certo.

E aí vem todo o SEGUNDO problema da história: até quando?

Esse apoio puramente da boca-pra-fora às causas muito importantes (como racismo, homofobia, depressão, dentre várias outras), sem ter coerência no discurso e sendo ordenado por uma força maior — o dinheiro, sempre — faz com que haja uma polarização entre o absurdo e o “epa, isso pode ser moderadamente aceitável”. Sem nenhuma razão prática, e tendo a acreditar que por pura ignorância, o Minas Tênis Clube (que é um time de vôlei, se podemos acreditar no GE) reforçou esse papinho torpe de que “é censura”. Fica muito fácil para os imbecis de plantão dizerem “ah, tá vendo?! Ele pediu desculpas, o próprio time reconhece isso — mas a ‘cultura do cancelamento’ fez com que ele perdesse tudo só por expressar sua opinião”. História diferente que teria acontecido se o Minas tivesse um Relações Públicas decente e visto que o suposto pedido de desculpas não é, na verdade, um pedido de desculpas; se tivesse dito, na cara e na coragem, que o pedido foi insuficiente. Aí sim o caso Maurício serviria de exemplo; aí sim não seríamos reféns da boa vontade de patrocinadores, do inconformismo de quem não tem porque se inconformar — eles lucram de todo jeito.

Quando os tomadores da decisão final enquadram seu discurso ao que está na moda para ganhar visualizações, sem verdadeiramente se importarem com o que gerou as represálias, eles reforçam essa moda e o argumento de que ela é ruim.

Por isso, o caso Maurício é um exemplo de babaquice. De quase todos os envolvidos. De novo, obrigado, patrocinadora (que aparentemente não quer se identificar, ou rezo para isso). Mas a atitude do Minas não é uma vitória — a da patrocinadora, talvez. A do Minas Tênis Clube é só mais um argumento frouxo que se perpetua na mente daqueles que não querem parar de machucar, humilhar e viver numa posição superior às pessoas, de certo modo, divergentes da sociedade; e usam essas pessoas para entrarem num discurso de vítima porque isso funciona, e o viés de confirmação trabalha exatamente nesses argumentos frouxos.

Agora uma curiosidade bacaninha: meu texto inteiro é RECHEADO de xingamentos, da maneira mais eloquente que consegui fazer. E isso não é hipocrisia: é para a gente colocar na balança o fato de que os grupos predominantes nunca são culturalmente ultrajados por duas linhas. Para e pensa, idiota.

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Caio Oleskovicz

Nefelibata ocasional // Creative Content Writer & SEO Copywriter // Otimista sempre nas horas erradas. Pessimista nas horas erradas também.